Há mais de 10 anos, os javalis começaram a aparecer na propriedade de Wesley da Cunha. Produtor de carne bovina e de laticínios de cabra no município de Uberaba, no oeste de Minas Gerais, ele tem sofrido grandes prejuízos com a proliferação dos javalis, que destroem até 30% do milho plantado para alimentar os rebanhos.
“Todo dia você precisa ficar atento. Todo dia tem que estar lutando, não pode descuidar, pois o prejuízo é muito, muito grande. Mesmo com o uso de cães, liberação para a caça, e até o controle ambiental feito por nós, que somos CAC, não é fácil, a população aumenta a cada dia”, desabafa o pecuarista.
A cerca de 540 quilômetros ao sul, em Brazópolis, também em Minas Gerais e próximo à divisa com o Rio de Janeiro, Dimas Silveira enfrenta problema semelhante: javalis começaram a aparecer há cerca de 10 anos e têm atacado a produção de milho usada para alimentar o gado da fazenda. “É um animal feroz e muito adaptado à nossa região. Come praticamente tudo. Já vi comendo cana e fuçando em todos os lugares”, relata o brazopolense.
Quem já enfrentou essa situação garante que não há limite para o apetite desses animais. Os javalis são onívoros, ou seja, se alimentam de tudo, desde vegetais até carcaças de outras espécies. Para piorar, por não serem nativos do Brasil, não possuem predadores naturais.
Como mostrou com exclusividade o portal Brasil 61, o número oficial de javalis abatidos em 2025 é o maior da história: 511.466. Especialistas, entretanto, acreditam em subnotificação e que o número real pode ser até cinco vezes maior.
Risco ao ecossistema e à sanidade animal
Além do prejuízo financeiro, os produtores se preocupam com o impacto no ecossistema. Em busca de minhocas, os javalis revolvem as nascentes de rios e córregos, que muitas vezes acabam morrendo por essa ação, em grande parte devido ao peso desses animais de grande porte.
Na lavoura de mandioca do produtor Alex Scarante, na cidade paranaense de Umuarama, a produtividade caiu drasticamente desde que os javalis começaram a aparecer. Esses animais atacam as mandioqueiras em busca das raízes e também destroem as reservas ambientais e as nascentes da propriedade ao destruírem as áreas de preservação permanente. “Eles pisoteiam e destroem a vegetação. Essa reserva que é tão importante, essa nascente de água que precisamos tanto”, lamenta o agricultor.
Dimas aponta ainda um terceiro problema: a propagação de doenças devido à proliferação dos javalis. “Eles poderiam reintroduzir facilmente no Brasil a febre aftosa. Isso faria o país perder imediatamente o status de livre da doença e travaria as exportações de carne, além de reduzir o consumo. O prejuízo seria enorme para toda a cadeia, do produtor ao exportador”, alerta.
Combate
Wesley, Dimas e Alex são caçadores registrados de javalis. Eles defendem o abate como a forma mais eficaz de combater essa espécie invasora, antes que ela cause ainda mais problemas à produção de alimentos no Brasil.
No Congresso Nacional, a Frente Parlamentar da Agropecuária apoia essa prática. O deputado Alceu Moreira (MDB-RS) defende que estados e municípios tenham autonomia para controlar animais invasores, função atualmente atribuída ao Ibama. “É necessário conceder aos estados e alguns municípios habilitados o direito de controlar esses animais. Não só o abate, mas também o aproveitamento com a devida regulação sanitária.”
O projeto relacionado ao tema está em debate na Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados. No Judiciário, o Supremo Tribunal Federal analisa a constitucionalidade da lei estadual de São Paulo que autoriza o controle populacional e manejo de espécies invasoras, aprovada em 2020. A Suprema Corte reconheceu a repercussão geral do assunto, ou seja, a decisão desse caso valerá para ações semelhantes em todo o Brasil.
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