O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central optou por manter a taxa básica de juros (Selic) em 15% ao ano — o maior nível desde julho de 2006. Desde setembro do ano passado, a Selic já teve sete aumentos consecutivos.
Essa decisão, contudo, gerou preocupação no setor produtivo, que aponta para prejuízos crescentes decorrentes dos juros elevados e teme impactos negativos para toda a economia nacional. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) criticou a manutenção da taxa e reforçou que a política monetária vigente tem dificultado o crescimento do país.
Para o presidente da entidade, Ricardo Alban, a continuidade de uma política contracionista nessa magnitude prejudica o Brasil, pois, segundo ele, a economia está sendo freada além do necessário em um momento em que a inflação segue em trajetória de queda.
“A taxa de juros atual gera custos desnecessários, colocando em risco o mercado de trabalho e, consequentemente, o bem-estar da população. Além disso, o Brasil mantém a segunda maior taxa de juros real do mundo, o que penaliza severamente o setor produtivo”, critica.
Alban também defende que, na próxima reunião do Conselho, prevista para 10 de dezembro, o Banco Central reduza os juros. O presidente da CNI entende que o Brasil está agindo na contramão do mundo em relação à fixação dessas taxas.
“O Brasil perde mais uma oportunidade de reduzir a Selic sem colocar pressão sobre o câmbio e, por consequência, a inflação, pois o diferencial de juros entre Brasil e EUA aumentou ainda mais”, afirma.
Taxa de juros alta – principal desafio das empresas industriais
Um estudo recente divulgado pela CNI revela que 80% das empresas industriais consideram a taxa de juros elevada como o principal obstáculo para a obtenção de crédito de curto prazo. Em relação a financiamentos de longo prazo, 71% dos executivos indicam a Selic como o maior entrave.
Segundo dados do próprio Banco Central, a taxa média de juros cobrada das empresas nas concessões de crédito — levando em conta linhas com recursos livres — subiu de 20,6% ao ano, em setembro de 2024, quando começou o atual ciclo de alta da Selic, para 24,5% ao ano, em setembro deste ano.
O presidente do Sindicato dos Economistas no Estado de São Paulo, Carlos Eduardo Oliveira Jr., explica que, em algumas situações, as empresas dependem de financiamento para capital de giro e investimentos. Com juros altos, o custo do crédito sobe, tornando quase inviável a modernização e expansão da produção.
“Isso repercute significativamente na redução dos investimentos, ou seja, projetos de expansão são adiados ou cancelados, comprometendo fortemente a inovação e competitividade. Além disso, pequenas indústrias enfrentam ainda mais dificuldades financeiras para obter novos créditos, o que gera um efeito em cadeia: juros altos aumentam custos operacionais, reduzem a margem de lucro e limitam a geração de empregos”, ressalta.
A mesma pesquisa mostra que as empresas também estão enfrentando o aumento recente das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), contribuindo para a diminuição do crédito e dos investimentos. Segundo o estudo, quase metade das indústrias desistiu de contratar ou renovar crédito, ou ainda reduziu seu volume, após a elevação das alíquotas do IOF.
Juros altos impactam indústria da transformação e da construção
No terceiro trimestre de 2025, 27% dos empresários da Indústria da Transformação indicaram os juros elevados como um dos maiores obstáculos para o setor.
Na Indústria da Construção, o impacto é ainda mais expressivo: 35,9% dos empresários consideram os juros altos como um dos principais desafios para o desenvolvimento do segmento.
O gerente de Análise Econômica da CNI, Marcelo Azevedo, destaca que esse descompasso gera pressão sobre os preços, já que a produção industrial não acompanha a demanda.
“A redução do crédito para as empresas afeta os investimentos; e não estamos falando apenas de investimentos no aumento da produção, mas também em inovação e melhoria da produtividade e redução de custos. Tudo isso diminui a competitividade da indústria nacional, prejudicando tanto o desempenho nas exportações, onde a concorrência é mais acirrada, quanto o mercado interno, na disputa com produtos importados”, aponta.
Selic: a maior taxa em quase 20 anos
Com Selic mantida em 15%, a taxa está no nível mais alto em quase duas décadas. Nesse patamar, a taxa de juros real fica em torno de 10,5% ao ano, considerando a inflação prevista para os próximos 12 meses, estimada em 4,06%.
Atualmente, a taxa real está cerca de 5,5 pontos percentuais acima da taxa neutra, que não estimula nem desestimula a atividade econômica, estimada pelo Banco Central em 5% ao ano.
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O diretor de Economia da CNI, Mário Sérgio Telles, ressalta a necessidade de preservar a atividade econômica, que tem sido afetada negativamente pelo aumento dos juros. Além da indústria, ele destaca que setores como Comércio e Serviços também sentem os efeitos.
“Iniciar a redução da Selic não significa que a política monetária irá se inverter completamente. Ainda assim, a taxa real permaneceria muito elevada. Desde que o Banco Central iniciou o ciclo de alta nos juros, a taxa média para empresas com recursos livres subiu de 20,5% para 24,5%. Ou seja, um aumento de quatro pontos percentuais nos custos financeiros para as empresas”, avalia.
Benefícios de uma taxa de juros mais baixa
Para a CNI, a taxa básica de juros ideal deveria estar em 11,9% ao ano, considerando as expectativas de inflação para os próximos 12 meses. Outro levantamento realizado pela entidade indica que, se a taxa básica fosse reduzida de maneira mais expressiva, 77% das empresas industriais brasileiras aumentariam seus investimentos nos próximos dois anos.
Esse percentual é uniforme entre empresas de todos os portes, indicando que a queda dos juros estimularia os investimentos e, consequentemente, o crescimento econômico em todos os setores.
Sinais positivos na inflação
Dados divulgados pela CNI apontam que a manutenção da Selic não combina com a situação atual da inflação. Conforme o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE, há uma tendência de queda, com o acumulado em 12 meses caindo de 5,5%, em abril, para 5,2%, em setembro.
Essa melhora é resultado, em parte, da queda nos preços dos alimentos nos meses de junho, julho, agosto e setembro, bem como na redução dos preços dos bens industriais.
Diante desse cenário, a entidade acredita que as expectativas para a inflação no fim de 2025 têm sido sucessivamente revisadas para baixo, caindo de 5,6%, em abril, para 4,5%, no fim de outubro, conforme o Relatório Focus. Além disso, as projeções para a inflação de 2026, 2027 e 2028 também diminuíram, estando atualmente em 4,2%, 3,8% e 3,5%, respectivamente.




