A empresária Karen Guerreiro conhece bem os desafios de equilibrar produtividade e jornada de trabalho. À frente da Só Mesas, Só Cadeiras, empresa de pequeno porte sediada em Santa Bárbara d’Oeste (SP), que há 33 anos fabrica móveis para bares e restaurantes, ela coordena cerca de 70 colaboradores. Recentemente adotou a jornada 5×2, com 44 horas semanais em regime de compensação.
Para Karen, a proposta de redução da jornada para 4×3, com 36 horas semanais — prevista na PEC 8/25, atualmente em debate no Congresso Nacional —, sem a devida compensação, poderia trazer impactos relevantes: “Inicialmente, para nossa empresa, essa redução causaria efeitos negativos, tanto no aspecto financeiro quanto na produtividade. Comprometeria a eficiência e dificultaria o cumprimento de prazos e metas.”
A empresária destaca que qualquer mudança precisa levar em conta a realidade das empresas de pequeno porte. “Diminuir a carga horária semanal sem reorganizar os turnos prejudicaria o fluxo de produção, aumentaria custos e geraria atrasos, impactando a competitividade e inviabilizando a implantação de um segundo turno. Nosso compromisso é manter a qualidade, cumprir os prazos e preservar os empregos. Para isso, as mudanças precisam ser viáveis econômica e produtivamente.”
Impactos econômicos da redução da jornada
O debate sobre o fim da escala 6×1 não envolve apenas direitos trabalhistas, mas também o impacto econômico. Uma pesquisa da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG) indica que a redução da jornada de trabalho sem o aumento correspondente da produtividade poderia reduzir até 16% do PIB brasileiro, com queda de até R$ 2,9 trilhões no faturamento dos setores produtivos.
O estudo mostra ainda que o país poderia perder até 18 milhões de empregos e sofrer uma diminuição de até R$ 480 bilhões na massa salarial. Mesmo em um cenário mais otimista, com aumento de 1% na produtividade, as perdas poderiam alcançar 16 milhões de empregos e R$ 428 bilhões em impacto negativo na renda dos trabalhadores.
Flávio Roscoe, presidente da FIEMG, ressalta que o aumento de custos tende a ser repassado ao consumidor, pressionando a inflação e afetando principalmente os pequenos negócios: “Imagine um restaurante atendido por dois garçons. Se a jornada for reduzida, será necessário contratar mais um garçom para manter o funcionamento. Esse custo extra inevitavelmente será repassado ao preço final.”
O estudo também aponta o risco de crescimento da informalidade, que já atinge 38,3% dos trabalhadores, além da perda de competitividade em relação a países com jornadas mais longas e custos menores, como México, China, Índia e Vietnã.
Posição do setor produtivo
A Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) destaca que mudanças estruturais dessa magnitude demandam amplo diálogo com o setor produtivo. Para a entidade, eventuais modificações na jornada de trabalho devem ser acompanhadas de medidas compensatórias e políticas que promovam a competitividade, equilibrando a valorização do trabalhador com a sustentabilidade financeira das empresas.
Próximos passos no Congresso
O deputado Luiz Gastão (PSD-CE), relator da Subcomissão Especial que analisa a PEC 8/25, detalha o cronograma das discussões: “A primeira audiência pública ocorrerá em São Paulo, no dia 30 de setembro, às 9h. Serão convidados representantes de empresários, trabalhadores e da sociedade civil. A intenção é ouvir diferentes perspectivas para formular um relatório que reorganize o debate sobre o fim da escala 6×1 e alternativas para a jornada de trabalho.”
O parlamentar assegura que o processo será conduzido com cautela: “Não há motivo para preocupação. Todas as ações serão planejadas buscando uma solução justa para todos os envolvidos.”
A proposta de redução da jornada ainda tem um percurso longo no Congresso, e o equilíbrio entre produtividade, competitividade e direitos trabalhistas permanece no centro do debate. Para empresas como a Só Mesas, Só Cadeiras, o desafio é se preparar para mudanças que garantam empregos e a qualidade dos produtos, enquanto o país avalia os impactos dessa transformação no mercado de trabalho.
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