Com a capacidade ainda apertada, a percepção de especialista é que qualquer imprevisto pode gerar turbulências
Após um 2024 de forte oscilação e com períodos de disparada de preços, os fretes marítimos de contêineres devem começar 2025 em patamar mais estável, mas ainda sob pressão. A expectativa de especialistas é que os preços tenham alívio no próximo ano. Porém, como a logística global segue com capacidade apertada, a percepção é que qualquer imprevisto deve voltar a gerar turbulências.
Neste ano, diversos fatores provocaram gargalos na navegação global e, consequentemente, aumento nos fretes. Os ataques no Mar Vermelho, que bloquearam o fluxo no canal de Suez, foram um dos principais motivos, junto a greves de estivadores nos portos dos Estados Unidos e congestionamentos nos terminais de contêineres brasileiros, afirma Leandro Barreto, sócio da consultoria Solve Shipping.
Na principal rota de importação do Brasil, de produtos vindos da Ásia, o frete no mercado “spot” (de curto prazo) bateu, em julho, US$ 9.350 por contêiner de 40 pés – um patamar próximo aos picos vistos durante o caos logístico da pandemia, segundo dados da Solve Shipping. Hoje, o preço já caiu para US$ 5.300, mas segue 130% maior do que no mesmo período do ano passado e três vezes acima do nível registrado em dezembro de 2019, antes da pandemia.
Na exportação, uma rota atualmente afetada pelas recentes turbulências é a Costa Leste dos Estados Unidos. Em outubro, quando os trabalhadores portuários americanos entraram em greve, o preço do trajeto chegou a US$ 8.400 por contêiner de 40 pés. Hoje, o valor já caiu para US$ 3.400.
Para Barreto, neste ano, o principal problema da logística global foram os ataques dos houthis (grupo rebelde do Iêmen) no Mar Vermelho, que bloquearam a rota para grandes navios no Canal de Suez, ampliando custos e o tempo de viagens das embarcações.
“Ano passado, havia expectativa de que os fretes iam derreter porque havia muitos navios chegando, o que amplia a capacidade. A previsão era um incremento de 10% de navios e crescimento de demanda de 3%. O problema é que a crise no Mar Vermelho, sozinha, consumiu 13% da capacidade do mercado, com os congestionamentos gerados”, afirma.
Entre analistas, não há previsão de que a situação se resolva no curto prazo. “É difícil imaginar que os ataques no canal do Suez vão parar. Então, esse fator vai permanecer em 2025 e isso talvez seja a razão mais forte da elevação do frete globalmente”, diz o diretor-executivo da consultoria Datamar, Andrew Lorimer.
Congestionamento
Os analistas também destacam o congestionamento nos terminais de contêineres brasileiros como um dos grandes problemas deste ano. Em 2024, o setor sofreu com a paralisação de um berço do BTP, terminal em Santos, durante boa parte do ano, devido a um acidente. Além disso, em Santa Catarina, o terminal do Portonave teve sua capacidade reduzida por obras e o porto de Itajaí ficou vazio boa parte do ano, em meio a uma troca turbulenta do operador portuário.
“Nós estamos com bastante gargalo nos terminais brasileiros. Isso afeta o frete também, porque muitas vezes os armadores embutem nos seus preços de frete o aspecto de logística dos terminais”, afirma Lorimer.
Para 2025, Barreto vê algumas boas notícias que podem aliviar parte da pressão. “O BTP não apenas voltou com três berços como entrará com mais dois guindastes, o que significa melhora de produtividade. Itajaí também vai voltar com dois berços, o que ajuda. Além disso, os armadores estão buscando levar commodities para portos não tradicionais, como o algodão do Matopiba [Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia] que foi desviado de Santos para Salvador, Itaguaí [RJ]”, diz.
Demanda firme
Outro fator que neste ano pressionou os fretes foi a forte demanda de importação no Brasil, algo que, diante da disparada do dólar, também poderá mudar em 2025, na avaliação de Lorimer. “Este ano, a gente quebrou recorde após recorde na importação de bens chineses. No acumulado até novembro, já aumentou mais de 20%. Mas essa demanda pode ser afetada pelo dólar. É possível que volte a cair um pouco a importação, ou que pelo menos não continue crescendo no mesmo ritmo.”
Já do lado das exportações, a demanda pode aumentar com o cenário de câmbio, diz Helmuth Hofstatter, presidente da Logcomex. “As exportações podem ser beneficiadas pela desvalorização do real frente ao dólar, pela queda de juros dos Estados Unidos e Europa e pelos pacotes de incentivos na China”, afirma.
No geral, a projeção dos especialistas do setor é que haverá um maior equilíbrio no ano que vem. “Para 2025, esperamos demanda e oferta mais equilibrada e fretes podendo reduzir, não a níveis anteriores à crise do mar Vermelho, mas um frete arrefecendo em relação a setembro, outubro de 2024”, diz Barreto.
Lorimer, do Datamar, prevê estabilidade. “Os fretes vão permanecer mais ou menos nesse nível, se não houver nenhum outro evento geopolítico que pode piorar a coisa. Para melhorar, teria de ter realmente algo significante no canal do Suez. Mas acreditamos que vai continuar nesse nível que está agora, variando de US$ 4 mil a US$ 7 mil dólares na importação de contêineres da China ao Brasil.”
Os analistas destacam que ainda há muitos fatores de incerteza, que a qualquer momento podem voltar a gerar pressão e fazer os preços disparar. “Qualquer ‘evento extraordinário’ acaba pressionando rapidamente os fretes e, por isso, a volatilidade tem se tornado o novo normal nos últimos anos. Ou seja, o que vai acontecer com os fretes em 2025 dependerá muito da geopolítica, guerras, greves, fenômenos da natureza, regulamentações da descarbonização do setor, entre outros”, afirma Hofstatter.
Por Tais Hirata e Luiz Fernando Figliagi